De regresso aos Caminhos da Ilha
Esta é a primeira vez que
partilho, publicamente e num órgão de comunicação social, aspetos da minha fé e
da minha caminhada como Romeiro de São Miguel. Na verdade, ao longo dos anos
tenho conseguido que este meu lado mais íntimo seja preservado. No entanto,
quando recebi a solicitação para participar neste número de A Crença, fui
tomado simultaneamente por um impulso para o fazer. As Romarias Quaresmais já
passaram por muita fases, umas boas e outras menos boas e a pior delas foi
quando se tornaram moda e objeto de curiosidade. Felizmente esse tempo passou e
talvez por isso me tenha libertado dessa peia que ponha a mim próprio e que me
inibia de partilhar os aspetos mais íntimos que um Cristão que também é Romeiro
e dessa forma vive a sua fé guarda e deve guardar para si.
Começamos já, quase todos, as
nossas preparações para as romarias quaresmais de 2018. A caminhada de
preparação para a grande e ansiada semana de verdadeira romaria é fundamental
quer para a formação dos novos elementos que se integram no rancho quer para os
irmãos que , sendo romeiros com experiência, sabem que não há duas romarias
iguais. Dai o interesse de acompanharem, também eles, de perto, as reuniões
preparatórias que, para além de um sentido pratico e de advertências essenciais
a quem vai numa romaria pela primeira vez, tem uma componente de formação
cristã que aporta a todos mesmo aos que se sentem mais próximos de Cristo.
O Romeiro que sente o peso da
tradição que dista ao primeiro quartel de XVI, que tem o sentido da fé e da penitência e que, de uma
forma ou de outra é um Cristão atento e próximo de Deus e nalguns casos, já “leva muitas romarias nas
pernas e na Alma” não carece de qualquer tipo de formação prática mas ganha
sempre mais um bocadinho quando
participa e partilha com os restantes irmãos a suas experiências.
A partilha é, de facto, a
palavra-chave de uma romaria. O Romeiro é, no meu entender, todo ele partilha.
Nesta semana em que fazemos desta
Ilha do Arcanjo São Miguel , como alguém já disse e escreveu, uma “ilha dos penitentes”, partilhamos a nossa
comida e fruímos da partilha de quem, muitas e não raras vezes, ainda tem menos
do que nós e o divide de forma voluntariosa e dedicada. Partilhamos, também não
raras vezes, a melhor divisão e a melhor cama de uma casa modesta. Partilhamos
o desespero e ou a esperança de um irmão
ou de uma família em casa de quem pernoitamos. Partilhamos alegrias e sinais de
fé de irmãos que nunca vimos e não vamos voltar a ver. Partilhamos também com muitos que revisitamos numa espécie de ritual
repetido e recorrente a cada ano que
passa e que nos esperam ansiosamente para nos receberem da melhor forma que
podem e sabem. Partilhamos as nossas mais particulares e mais secretas
angústias e desejos, as nossas preocupações. Mas, acima de tudo, partilhamos os
nossos testemunhos de fé em Maria Nossa e Sua Mãe Santíssima.
O Romeiro tem uma
responsabilidade acrescida junto da restante comunidade cristã e laica. O
Romeiro, por o ser, tem que compreender que aos olhos de terceiros, da restante
sociedade, tudo o que ele faça de bem não passa de uma obrigação e tudo o que
possa fazer de menos bem será recriminado em dobro pelo simples facto de ser um
Homem que não esconde a sua vontade de estar perto de Deus.
Um Romeiro é um Cristão de todo o
ano, que participa na Eucaristia, que se completa nos sacramentos, que se
envolve na vida da ou das paróquias, que partilha essa vivência com os que mais
necessitam e que nesta semana se torna mais próximo do Deus em que deposita as
suas esperanças e, peregrino e penitente, cala mais fundo a sua fé e dá mais
passos para estar ainda mais perto de
Deus.
Nuno Barata Almeida E Sousa
Racho de Santa Clara
Texto publicado no semanário de inspiração Cristã A Crença edição de 2018-01-28
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